"Oh! Que bom!..."

Pedro Moreira
Pedro Moreira é professor de Português,
revisor, consultor,autor dos livros
"Casos e Coisas do Pará Antigo",
"Cronicontos" e
"O Pássaro e a Dona e Outros Trexos".
Oscar Niemeyer, hoje na flor das 101 primaveras, confessa-se avesso às grandes alturas, motivo suficiente para justificar sua fobia a viagens aéreas. Daí eu não entender por que cargas d?água uma pessoa vítima da aversão às grandes alturas sinta-se bem nas altitudes que ele atingiu em sua arte de arquiteto superior...
Brincadeiras à parte, para chegar às grimpas em que ele hoje está, sob os aplausos das sumidades de sua área, só mesmo sendo um Niemeyer, com toda sua simplicidade, com toda sua modéstia e importância de cidadão do mundo.
Voltando aos aviões, pavor deste gênio, ele conta que, quando mais novo, costumava atravessar o Atlântico, mas sob os cuidados e atenções de um sobrinho. É que, em sendo vítima da aerofobia (medo de grandes alturas), tinha de superar o problema, a menos que renunciasse aos generosos "cachês" das conferências que concedia na Europa. Afinal, garantir o leite das crianças era preciso. Só que, nesta história, não entra leite, mas uísque, e dos bons. O "marvado" vinha em forma de meia garrafa para a ida e meia para a volta, ou seja, o ilustre aerófobo "apagava" antes de chegar ao destino e antes de voltar à pátria, sempre monitorado pelo zeloso sobrinho. Diz Niemeyer, em sua entrevista:
- Quando chegávamos a Paris, por exemplo, meu sobrinho me dava uns sacolejos, me "ressuscitava" e soprava aos meus ouvidos: "Tio, já chegamos a Paris! Olhe lá a Eifel!" Eu dizia sempre: "Oh! Que bom!..."
Pois foi assim, de "oh! Que bom!? em "oh! Que bom!? que o pequenino-grande Niemeyer alicerçou seu ilustre nome como astro da arquitetura mundial, projetado que foi além de muitos horizontes, depois de desenhar o conjunto arquitetônico da Pampulha e Brasília.
Esta questão de se apavorar diante de uma viagem de avião depende muito de uma coisa importantíssima, definidora de nossas reações: a estrutura psicológica. Há casos de pessoas que, por dinheiro nenhum, empreenderiam uma viagem aérea, mesmo que fosse um prêmio. Pois fizeram a tal viagem (sem uísque...) e voltaram.
Aconteceu comigo um episódio ilustrativo desta questão de fobia a viagens entre as nuvens. Como professor do então Colégio Estadual Fernando Otávio, em pleno governo presidencial de José Sarney (que sucedeu a Trancredo Neves) fui contemplado, juntamente com outros professores mineiros, com uma viagem cultural à Europa, devidamente valorizada por uma apetitosa ajuda de custo. Lembro- me de que, ao chegar ao colégio, esperava-me à porta o diretor do turno, Dr. Pedro Mendonça. Entre sorrisos, estendeu- me um envelope. Era uma mensagem do Ministério da Educação, comunicando-me que havia sido agraciado com uma viagem à Europa, "por mercê da dedicação profissional e escolha democrática dos alunos". Minha emoção não foi pequena, abafada por um lastro de decepção. Fui sincero em dizer ao Pedro:
- Nada feito, meu caro! Não ando de avião nem em sonhos, só em pesadelos...
A reação do meu colega foi de desapontamento. Tentaram converter a viagem em dinheiro. Nada foi possível. Que se há de fazer... De aviões e outros objetos voadores quero distância. Eles lá no céu, eu cá na terra...