"Adonde" parei?...

Pedro Moreira
Pedro Moreira é professor de Português,
revisor, consultor, autor dos livros
"Casos e Coisas do Pará Antigo",
"Cronicontos" e
"O Pássaro e a Dona e Outros Textos".
Lenda ou verdade, certa vez o ex-presidente FHC viu-se em apuros numa faculdade paulista quando ali dava uma de suas concorridas palestras. Maldita a hora em que precisou escrever no quadro a palavra ascensão. Uma baita dúvida o pegou de surpresa naquele instante: como grafar a traiçoeira palavrinha? Uma alma boa, por certo versada em miudezas ortográficas, o socorreu na aflitiva situação, soprandolhe aos ouvidos letra por letra.
Mais de uma vez, ouvi FHC repetir um surrado provérbio, por sinal de discutível construção, atropelador das normas da chamada língua culta: "Diga-me com quem andas que lhe direi quem tu és". Assim mesmo, misturando pronomes, alhos e bugalhos, provando que, decididamente, questões linguísticas não são o seu forte.
Tudo isso em contraste com sua imagem de homem culto, dono de primorosa inteligência, bom escritor, brilhante professor universitário. Ainda bem que para seus escritos FHC disponha de tarimbados revisores, esses anjos da guarda encarregados da última demão nos textos de quem, mesmo talentoso, escreve de ouvido, ou seja, indiferentes às convenções gramaticais.
Dúvidas de escrita têm sido, sim, a pedra no meio do caminho de pessoas de todas as profissões e extratos sociais. Em último caso, apela-se para a criatividade. Mal comparando, isso lembra um episódio ocorrido há muitos anos numa cidadezinha destas montanhas. Na agência bancária, o prefeito local tinha de preencher um cheque de seiscentos cruzeiros. Difícil missão! Como escrever "seiscentos"? Nada tendo a perder, dada sua limitada cultura, consultou um vizinho de balcão:
- Oi, cumé qu’iscreve esse negócio de "seiscentos"?
O coitado do vizinho era tão verde quanto seu "ilustre" interlocutor, de forma que se passaram compridos minutos até que aparecesse a solução para o impasse cultural. Alguém sugeriu:
- Uai, sô, faz dois cheques de trezentos, que resorve!
E o prefeito, já em via de sofrer um ataque de nervos:
- Tô lascado! E "trezentos", é com s ou com x?...
Ainda a propósito de aberrações culturais, em velhos tempos ocorreu outro episódio bastante cômico, desta vez num cartório aqui do Pará. Certo dia, lá estava um líder político de pequena cidade vizinha – o Manuel Venâncio, rico fazendeiro, conhecido por Mané Burrão, como ele próprio se identificava. Esparramada sobre uma mesa, a ditosa criatura assinava, ou melhor, espalhava mecanicamente seus garranchos num documento qualquer. Armava-se, então, todo um ritual de tensão nervosa, tremedeira, suadeira... Por isso, ele deslizava a caneta com a vagareza de um caracol dorminhoco. Exatamente neste momento heróico, adentra o recinto um conhecido seu, que o cumprimenta, muito expansivo;